domingo, 17 de setembro de 2017

Lido: F de Foguete

Ler hoje este conto escrito há longuíssimos 74 anos chega a ser deprimente. Porque Ray Bradbury sempre foi melhor quando escrevia histórias repletas de sentido de maravilha, e esta é uma dessas histórias. Mas é uma história cheia de um sentido de maravilha que hoje amargou de tal forma que lê-se este F de Foguete (bibliografia), lê-se o que se sonhava há três quartos de século, e não é possível evitar pensar-se no tanto que ficou pelo caminho e no tanto de sonho que não se cumpriu.

Bradbury põe-nos a assistir às vidas e conversas de adolescentes (dois em especial) repletos de sonhos, com a imaginação cheia de espaço e foguetões, ansiosos por ser escolhidos entre a multidão para também eles subirem para fora do planeta, onde a humanidade (ou só os EUA, não fica claro; Bradbury tendia a misturar as duas coisas... como tantos outros escritores americanos, de resto) desbrava ativa e energicamente novas fronteiras, sabendo que isso só acontece aos melhores, sabendo que as probabilidades não são muitas, mas cheios de sonhos na mesma. E depois um deles é escolhido. E depois o outro.

E lendo isto hoje, comparando este futuro de Bradbury com o nosso presente que com toda a certeza está muito mais adiantado no tempo do que o futuro que ele imaginou, comparando o programa de recrutamento maciço e uma geração inteira de olhos postos nas estrelas com o minúsculo punhado de astronautas que a nossa realidade engloba e a indiferença, quando não é hostilidade aberta, com que fatias assustadoramente grandes da sociedade encaram a exploração espacial e os esforços para fazer o Homem aprender pelo menos a viver no espaço circunterrestre, é quase inevitável que se instale o desânimo e uma certa saudade por um futuro que nunca existiu.

O maravilhamento que a ficção científica pode trazer faz uma falta imensa à nossa sociedade. Mas ela recusa-o. Uma imensa maioria ignora e rejeita a FC e entre aqueles que não o fazem as preferências atuais recaem claramente sobre a que é sombria, distópica, sem esperança. Falta-nos a luz do maravilhamento com as possibilidades que o futuro pode abrir. Seria uma luz que nos poderia guiar. É uma luz que este conto tem com abundância. E é uma luz que está quase extinta.

Recomendo a leitura deste conto. É antigo, e não o esconde. Mas mantém-se relevante. E está escrito com a habitual qualidade de Bradbury.

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